Rodrigo Karpat responde sobre rediscussão de assunto, participação em assembleia e unidades comerciais
O advogado especialista em condomínios Rodrigo Karpat responde as dúvidas dos leitores sobre vida em condomínio.
Rediscussão de assunto
Pergunta 1, de Ivete Pedrini Barrionuevo
Sr. Rodrigo, pode o síndico colocar em pauta novamente um itém que já passou por votação em assembleia e foi recusado por votação? Em caso negativo, qual artigo do Código Civil para que posso levar em reunião?
RESPOSTA DO ESPECIALISTA:
As assembleias são soberanas e o que for decidido ali deve ser seguido, desde tenham sido obedecidas as formalidades legais para a convocação e que os assuntos levados à tona tenham feito parte da ordem do dia.
Porém, tais decisões não tornam a assembleia imutável, uma nova assembleia pode rever o posicionamento da assembleia anterior.
Assim, a mesma assembleia que trouxe à tona um assunto, pode em determinado momento rediscutir esse assunto, sempre tendo em vista o interesse coletivo, que pode em determinado momento ter sido levado a erro, ou não tendo uma informação técnica, fazer com que o corpo diretivo ou o síndico isoladamente traga novamente algum assunto para rediscussão.
De qualquer forma, se a rediscussão trouxer algum prejuízo, a situação poderá acarretar em perdas e danos emfavor de quem tenha tido qualquer prejuízo em função de uma rediscussão, como por exemplo: na autorização de fechamento de sacada de uma forma, e com a consulta de um arquiteto verificou-se que perante a prefeitura deveria ser feito de outra forma, porém, algumas unidade já haviam modificado da forma incialmente sugerida, isso gerou um dano que deve ser suportado pelo condomínio.
Na lição De Biasi Ruggiero:
“ A resolução da assembleia geral não cria direito adquirido, podendo ser tornada insubsistente por resolução posterior. É evidente que há casos em que, pela sua peculiaridade, essa revogação gera perdas e danos. A revogabilidade das deliberações da assembleia, assim como a alterabilidade da convenção, integra o direito de propriedade.
As deliberações são eficazes até que sejam anuladas judicialmente ou alteradas por outra assembleia, a menos que trate de ato inexistente ou nulo de pleno direito. É valida a ratificação, por outra assembleia , de deliberação inquinada de vício.”
Ruggiero, Biasi. Questões Imobiliárias, Editora Saraiva, 1.997, fls. 26 e 27.
Participação em assembleia
Pergunta 2, de Roberto Tadeu Gorios ·
Filho do proprietário devidamente identificado pode participar da assembleia, mesmo não sendo morador do imóvel?
RESPOSTA DO ESPECIALISTA
Roberto,
A assembleia de condomínio é local exclusivo de condôminos, gestores e em alguns casos de convidados que tenham relação com os assuntos a serem abordados, como por exemplo: a solicitação de explicação por parte de um fornecedor sobre um serviço que será prestado.
Por condôminos entendemos nos termos do art. 1.334, § 2°, do Código Civil, que são os proprietários ou todos aqueles que apesar de tecnicamente não serem proprietários, forem titulares de direito de aquisição sobre a propriedade imobiliária, como por exemplo: Os promitentes compradores, cessionários, promitentes cessionários.
Os seja, aquele que não detêm ainda o seu nome no cartório de registro de imóveis, mas tem documento hábil para provar que é o dono do bem, conforme já entendeu o STJ em questões atinentes ao contrato de gaveta.
Nesse caso, o proprietário é aquele que consta no documento aquisitivo (compromisso de compra e venda) ou matrícula do imóvel.
Deve-se ficar atento ainda, pois até mesmo um dos cônjuges pode não ser proprietário, como por exemplo: No caso do casamento pelo regimente de comunhão parcial de bens em que um dos cônjuges tenha adquirido o bem antes da constância do casamento, ou com o dinheiro de herança ou até mesmo herdado. Nesse caso o cônjuge que não concorreu com a aquisição não é proprietário.
Quanto ao filho, o mesmo não é condômino e poderá votar somente mediante procuração.
Unidade comercial
Pergunta 3, de Sérgio Cunha Gomes
Caro Rodrigo. Tenho loja no térreo de condóminio comercial que também possui salas, também comerciais no primeiro andar. Pergunto se a responsabilidade de se instalar e manter uma central de interfones exclusivas para estas salas é, necessariamente, uma obrigação do condomínio.
RESPOSTA DO ESPECIALISTA
Sergio,
A questão da fração ideal traz muita controvérsia, como temos visto nos casos de moradores de coberturas que entendem que não devem pagar a suas cotas condominiais da mesma forma que os demais condôminos das unidades tipo, somente pelo fato de terem muitas vezes um quintal ou um pequeno jardim privativo.
Nesse sentido o TJMG tem se inclinado em modificar a forma de rateio interferindo na relação que deveria ser estabelecida entre os condôminos através da convenção de condomínios.
Como fundamento, os acórdãos destacam que a modificação da forma de rateio objetiva que não ocorra o enriquecimento ilícito e que a modificação segue o princípio do proveito efetivo.
De qualquer forma, entendo que a fração ideal é o critério mais justo, mesmo em situações que muitas vezes não parecem ser, uma vez que o rateio por fração ideal é a regra, porém os condôminos podem regular/ alterar a forma de rateio.
Cabe ao incorporador no registro do empreendimento elaborar a convenção e o memorial de incorporação do empreendimento, e neste momento o incorporador tem o poder de optar em estabelecer um rateio diferente para partes diferentes, como por exemplo lojas ou deixar fora certas despesas como interfones exclusivos para salas e que não serão utilizado pelas lojas conforme mencionado pelo leitor.
O Doutrinador Nascimento Franco falou sobre o tema e destacando antigo Acordão do STF, que ainda serve de lição.
“Uma vez que no condomínio em edifícios conjugam-se três elementos, ou seja: propriedade comum, uso ou gozo e encargos.”
Acórdão da 6ª Câm. Do TJGB, na ApCiv 49.085 ( DJU de 05.03.1959) acórdão da 1ª T. do STF, no RE 20.597. “ A obrigação de contribuir para as despesas gerais, por parte das lojas do pavimento térreo, só existe se for imposta por cláusula expressa na Convenção; obrigação de contribuir com redução 50%.
Não se pode atribuir os ônus de tais despesas a comunheiros que nada têm, direta ou indiretamente, com serviços que nenhuma utilidade lhes prestam. Está neste caso o proprietário da loja no rés-do-chão, e com saída livre, quanto às despesas de manutenção dos elevadores. Está, neste caso aquele que é proprietário de apartamentos sem direito à garagem, quanto às despesas com o garagista. Mas é evidente que prevalece e obriga a disposição em contrário inserta na convenção de condomínio. A isenção só existe se a Convenção nada dispuser a respeito RT 653/138”.( grifei)
Importante destacar que caso exista a previsão para o rateio, mesmo que pareça ser ineficiente, é valido, pois está alinhado com a lei e com a convenção que tem a prerrogativa de definir o critério de rateio.
Dessa forma, para alterar tal critério de rateio, o meio é a convocação de assembleia e alteração de convenção pelo voto de 2/3 dos condôminos.
Em acordão recente no STJ no mesmo sentido
RECURSO ESPECIAL – AÇÃO ANULATÓRIA DESTINADA A ANULAR CLÁUSULA DE CONVENÇÃO CONDOMINIAL QUE TRATA DA PARTICIPAÇÃO DOS CONDÔMINOS NO RATEIO DAS DESPESAS CONDOMINIAIS, SOB O FUNDAMENTO DE QUE A UNIDADE LOCALIZADA NO PAVIMENTO TÉRREO (LOJA COMERCIAL) NÃO USUFRUI DE DETERMINADOS SERVIÇOS – DEMANDA JULGADA PROCEDENTE PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS – A CONVENÇÃO CONDOMINIAL, POR REFLETIR A VONTADE MAJORITÁRIA DOS INTEGRANTES DA COLETIVIDADE E POR SE AMOLDAR NECESSARIAMENTE À LEI, É SOBERANA PARA DEFINIR OS CRITÉRIOS DE RATEIO DAS DESPESAS CONDOMINIAIS – RECURSO ESPECIAL PROVIDO. INSURGÊNCIA DO CONDOMÍNIO DEMANDADO. Hipótese em que se pretende a anulação de cláusula da convenção condominial alusiva ao rateio das despesas condominiais, ao argumento de que a loja comercial situada no pavimento térreo, com saída própria à via pública, não usufrui de determinados serviços, razão pela qual não deveria participar do rateio dos correspondentes gastos. Demanda julgada procedente pelas instâncias precedentes. 1. Em se tratando de relação puramente obrigacional, a refletir ação de natureza pessoal (caráter, ressalta-se, explicitado por este subscritor, por ocasião do julgamento do Resp n. 1.035.778/SP), o prazo prescricional da correlata pretensão é regido pelos artigos 177 e 179 do diploma civil de 1916, que preceituam ser de vinte anos. 2. A lei de regência dos condomínios em edificações (lei n. 4.591/64)é expressa em atribuir à cada condômino a obrigação de arcar com as respectivas despesas, em proporção à quota-parte que lhe couber no rateio. O diploma legal sob comento pontua, ainda, que, não dispondo a convenção condominial em sentido diverso, a quota-parte corresponderá à fração ideal do terreno de cada unidade. 3. Ressai evidenciada a relevância da convenção condominial para a definição do critério de rateio das correlatas despesas, notadamente porque esta reflete a vontade, como um todo, dos condôminos. No ponto, não se pode deixar de destacar o caráter normativo da convenção, a reger o comportamento de todos aqueles que voluntariamente integrem ou venham a compor determinado condomínio, não se restringindo às pessoas que participaram da constituição de tal agrupamento. 3.1. Por transcender à vontade daqueles instituíram o condomínio, de modo a regrar os direitos, deveres e comportamentos dos integrantes de uma coletividade, a convenção condominial deve, ainda, conformar-se com a lei, impositivamente. 4. Cabe, portanto, ao instrumento normativo sob comento regular o critério a ser adotado para o rateio das despesas do condomínio. Para este escopo, é salutar – e disso não se diverge – que os custos de determinadas despesas devem, em tese, ser atribuídos apenas aos comunheiros que se beneficiem, direta ou indiretamente, dos serviços prestados pelo condomínio. Não obstante, a convenção condominial é soberana para definir parâmetro diverso do ora apontado. 5. No caso em foco, a convenção condominial, expressamente, determina o rateio das despesas condominiais em conformidade com a fração ideal do terreno de cada unidade. Parâmetro, inclusive, adotado objetivamente pela lei, do que se conclui não guardar, em si, qualquer arbitrariedade. A considerar a existência de disposição convencional, de modo a estabelecer o critério pela qual as despesas condominiais devem ser partilhadas, sua observância, por determinação legal, é de rigor. 6. Não se tratando, pois, de vício de consentimento, a alteração da convenção condominial, em cláusula que guarda, inclusive, correspondência com a lei de regência, deve ser providenciada pelos meios ordinários, quais sejam, convocação do órgão deliberativo ou executivo e votação com observância dos quóruns definidos em lei. 7. Recurso especial provido, para julgar improcedente a ação anulatória.
(STJ – REsp: 784940 MG 2004/0072071-4, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 20/03/2014, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/06/2014)( GRIFEI)