Há solicitações que podem sobrecarregar o síndico. Veja como não agravar a situação e se eles podem ser considerados antissociais
Por Fernando Zito*
Tenho recibo consultas relacionadas a moradores que sofrem de problemas psicológicos, por vezes residem sozinhos, recaindo no colo do síndico a responsabilidade manter a ordem.
Em um dos casos a moradora foi reclamar na portaria, pois disse que alguém teria entrado em sua unidade e colocado alguma substância em sua bebida, chegou a enviar e-mail para administração dizendo que era veneno, que a fez dormir por horas. Também disse que seu carro amanheceu com a janela aberta, molhando seu interior.
Também enviou por e-mail Boletins de Ocorrência, feitos através da internet, mas que não foram aceitos pela Delegacia, em razão dos relatos que eram um tanto quanto fantasiosos, criações da cabeça da moradora.
A síndica começou a perceber que era uma pessoa que sofria de algum tipo de distúrbio, porém, para piorar a irmã dela referendava os relatos.
Como o imóvel é alugado, a síndica tentou conversar com o proprietário e passar tudo que estava ocorrendo na tentativa de contar com sua colaboração, porém, recebeu a seguinte resposta:
“Se você pagar a multa em razão da rescisão do contrato de locação, eu tiro a inquilina de lá.
“Ou seja, o proprietário não está muito preocupado com o que ocorre no condomínio e principalmente dentro da unidade. Ele quer apenas receber os alugueres mensais.
O condomínio, então, encaminhou notificação para esse proprietário, que sequer respondeu, e mais uma vez, além de todos os problemas diários vividos pela síndica, fica obrigado a administrar esse problema.
Isso porque outros moradores, que não têm qualquer relação com essa vizinha com transtorno, como outras mães e pais que possuem filhos pequenos, começam a cobrar a síndica, com razão.
É claro, eles preocupados que uma situação mais grave possa acontecer, afinal de contas, a direção do condomínio não sabe o problema psicológico que essa moradora tem, se faz uso de remédios controlados. Além disso, o fato dela morar sozinha torna o caso ainda mais delicado, pois não se sabe o que ele está ou vem fazendo dentro da unidade.
Em razão do proprietário não tomar qualquer providência, caberá ao condomínio adotar as providências cabíveis.
Nesse caso, será necessário abrir processo judicial, para demonstrar o risco dessa moradora residir sozinha, bem como todos os problemas já causados e que a mesma não tem a menor possibilidade de viver em coletividade.
Afinal, pode colocar em risco a integridade física dos demais moradores. Nesse caso, a relação existente entre inquilino e proprietário será encerrada, já que o que se busca é manter a ordem naquela comunidade. O judiciário já tratou de casos similares, até autorizou a expulsão do condômino antissocial.
“AÇÃO DE EXCLUSÃO DE CONDÔMINO ANTISSOCIAL. TUTELA ANTECIPADA, DEFERIMENTO. POSSIBILIDADE. Verossimilhança dos fatos alegados, tendo em vista que o agravado comprova, de forma inequívoca, o comportamento antissocial do demandado a impedir a convivência pacífica com os demais moradores. Receio de dano irreparável ou de difícil reparação, uma vez que a permanência do réu no condomínio coloca em risco à segurança e à integridade dos demais moradores. Manutenção da decisão que deferiu a tutela antecipada de exclusão do condômino, nos termos do art. 273, I, do CPC. NEGARAM SEGUIMENTO ao recurso, por decisão monocrática (TJ-RS. Agravo de Instrumento nº 70065533911, Décima Oitava Câmara Cível. Relator: Nelson José Gonzaga, j. 13.08.2015)”.
Por outro lado, existe julgado proibindo a expulsão.
“Condomínio Edilício. Exclusão de condômino de personalidade antissocial. Sentença que decide pela impossibilidade de aplicação dessa sanção gravosa, ao fundamento de que não possui previsão no Código Civil Brasileiro. Omissão do legislador que, por si só, não veda a dedução da pretensão em juízo. Necessidade de produção de prova oral para o correto desate da lide. Sentença anulada. Recurso provido. (TJSP; Apelação Cível 1002457-23.2016.8.26.0100; Relator (a): Maria de Lourdes Lopez Gil; Órgão Julgador: 38ª Câmara Extraordinária de Direito Privado; Foro Central Cível – 16ª Vara Cível; Data do Julgamento: 23/08/2018; Data de Registro: 29/08/2018)”.
Por isso, é de extrema importância produzir todas as provas possíveis e tentar solucionar o caso de forma extrajudicial.
E o outro caso, a moradora também sofre de transtorno psicológico, porém, reside com a irmã, que estava viajando quando ocorreu determinado fato. Por coincidência, o relato é parecido, dizendo que a vizinha de cima estava jogando veneno pela sacada ao ponto de ficar esperando na porta do elevador para tirar satisfação. Imaginem se as duas resolvem iniciar uma briga.
Também coube ao condomínio intervir, porém, nesse segundo caso, em razão de ter a irmã, a situação foi rapidamente controlada, pelo menos de forma momentânea.
De toda forma, mais uma vez o condomínio teve que agir para garantir a manutenção da ordem, que é exatamente aquilo que as pessoas buscam quando optam em morar em comunidade; ter paz, tranquilidade.
São dois fatos que chamaram bastante atenção através de relatos de síndicas, mas que não envolviam brigas de vizinhos no dia a dia, como barulho provocado por criança, animais de estimação, etc.
Mas é um assunto trouxe uma certa preocupação, pois não sabemos se isso é um fato relacionado com o pós-pandemia, falta de emprego ou qual seria o problema social está ocorrendo e provocado todos esses transtornos.
É o que mais fica de alerta: Se você tiver um caso similar de alguma forma, esse artigo tentou trazer duas realidades.
Agora, se o morador tiver um surto psicótico, o condomínio deverá entrar em contato com o responsável e, se necessário for, o resgate. Mas os síndicos precisam sempre ficar espertos com esse tipo de comportamento e agir com proatividade.
Nunca, em nenhuma situação, o gestor poderá ficar omisso, e tentar de alguma forma mudar essa realidade nem que para isso tenha que procurar o judiciário.
(*) Advogado militante na área de Direito Civil; especialista em Direito Condominial; pós-graduando em Direito e Negócios Imobiliários pela Damásio Educacional (conclusão em 2021); pós-graduado em Direito Tributário pela PUC/SP; pós-Graduado em Processo Civil pela PUC/SP; membro da Comissão de Condomínios do Ibradim; palestrante especializado no tema Direito Condominial; colunista do site especializado Síndiconet, Sindiconews, Condomínio em Foco e das revistas “Em Condomínios” e ”Viva o Condomínio”.
via https://www.sindiconet.com.br/informese/condominos-com-transtornos-psicologicos-o-que-fazer-colunistas-fernando-augusto-zito