Especialistas afirmam que determinar normas de conduta na convenção e regimento pode evitar transtornos nas locações temporárias
Com a chegada do verão, uma das principais preocupações dos síndicos é como lidar com o aluguel de temporada. Se proibir o tipo de locação fere o direito de propriedade, é nas normas do regimento interno e da convenção que se podem exigir comportamentos e ações que garantam tranquilidade e segurança ao condomínio. Caso não constem regras para a locação nos regulamentos, para alterá-los precisa-se de votos favoráveis de dois terços da fração ideal. No mais, é preciso fiscalizar e multar, se for necessário. O condomínio Solar do Araguaia, no Centro de Florianópolis, passa por uma situação peculiar. Apenas um dos 22 apartamentos (de três quartos cada) aluga por períodos curtos e temporada. Em uma das situações, o proprietário informou ao condomínio que oito pessoas iriam ficar alguns dias na unidade, durante um período de micareta que ocorre anualmente na Capital. No dia da chegada, o condômino Luis Carlos Aguiar lembra que 15 rapazes ocuparam o apartamento, mas não imaginava que ainda haveria visitantes sem informar ao condomínio, à noite.
O conselheiro Antônio Eugênio Terêncio relata que se sucedeu uma série de comportamentos fora do padrão do condomínio. Jovens entravam no elevador sem camisetas, bebiam nas áreas comuns. “Quando voltaram da festa, virou vandalismo. Pegaram extintores de incêndio e começaram a brincar no hall. Um deles foi acionado, e danificou a pintura do teto da entrada”, lamenta. O condomínio encaminhou notificação à proprietária, que terá de pagar pelos prejuízos. Por episódios como esse, o aluguel de curto período entrou em debate na gestão atual, mas caberá à síndica eleita, Leiri Remor, buscar incluir na convenção de 1982 as regras que a nova situação exige.
Uma das preocupações da síndica eleita do Solar do Araguaia se refere aos alugueis sem contrato. Os serviços criados na internet impulsionam o tipo de negociação, como a rede social mundial de aluguel por temporada Airbnb. Os próprios donos colocam as unidades ou quartos à disposição e negociam pelo site ou APP (aplicativo) com o interessado. Normalmente ficam poucos dias e não criam nenhum tipo de vínculo com o condomínio.
De acordo com o diretor administrativo de Condomínios da Roderjan Contabilidade e Administradora de Condomínios, Julio Kipper, o síndico não tem como determinar ao proprietário a forma que será realizada a locação do imóvel (se por imobiliária ou direta), pois é ao dono da unidade que cabe tal decisão. Mas, estabelecido em convenção, o condomínio pode exigir que o condômino locador informe o número de pessoas e tempo de permanência, assim como apresentação de documentos dos inquilinos e visitantes. “A convenção do condomínio em seu regimento interno pode criar algumas normativas para regulamentar algumas informações necessárias”, explica. E recomenda não deixar passar despercebidos excessos de inquilinos, mas saber cobrar da parte certa. “Sempre quem responderá pelas atitudes de suas visitas, seus hóspedes ou locadores é o proprietário da unidade, pois este é que possui a representação legal do imóvel”, explica o especialista da administradora localizada em Itapema.
Segundo o diretor, “a forma sugerida de ação, desde que haja a previsão na convenção é a advertência e o registro no livro de ocorrências, para após emissão de uma notificação extrajudicial e, no caso de reincidência, a aplicação da multa dentro dos parâmetros estipulados na convenção”. Vale lembrar que, no caso de reincidência na mesma unidade, não importa se os inquilinos são outros, não é preciso notificar novamente, a multa pode ser aplicada já que é direcionada ao proprietário e não ao locatário.
Limitação de pessoas por apartamento e multas
De acordo com o presidente do Sindicato da Habitação (Secovi) de Florianópolis e Tubarão, Fernando Wilrich, em cidades litorâneas e turísticas é difícil evitar os aluguéis de temporada. É uma questão difícil de trabalhar, pois legalmente não se pode criar restrições ao direito de propriedade. “Não é possível impedir o aluguel de temporada, tem condomínio que opta, mas decisões judiciais mostram ser ilegal”, explica. Wilrich aconselha que os condomínios devam orientar os proprietários que nos contratos de aluguéis de temporada, o usuário respeite as condições dos imóveis. No máximo, duas pessoas por quarto. Isso pode estar estabelecido no contrato. “Ao alugar apartamento de três quartos e aparecerem 20 pessoas, extrapola os recursos até de água. A convenção pode sim estabelecer critérios, ao se levar em conta a relação de prejuízo ao condomínio. A legislação diz que tudo que traz prejuízo ao sossego dos demais condôminos seja coibido. O prédio tem condições de atender até x usuários por unidade. Se extrapolar, é infração”, observa.
O presidente do Secovi acrescenta que em caso de situações de excesso de pessoas ou perturbação ao sossego, o síndico deve procurar o proprietário ou a imobiliária (que recebe procuração do dono para responder pelo imóvel), pois “geralmente, acontece sem conhecimento do proprietário e imobiliária”, considera. Alguns condomínios ao invés de limitar número de pessoas por apartamento para garantir que não haja prejuízos aos outros condôminos, optam por cobrar uma taxa de locação de temporada, o que se justificaria pelo aumento do consumo de água ou pagar despesas de itens danificados. Mas Kipper, alerta: “Por mais que aprovada em assembleia condominial ou em convenção condominial, não pode ser cobrada em razão de ferir um dos direitos da propriedade, que são os frutos”, esclarece.
Modernização das normas
Foi justamente ao estipular regras para usuários temporários e multar os proprietários sempre que as normas eram desrespeitadas, como a do horário do silêncio, que os problemas com locação diminuíram no residencial Cenyra, em Canasvieiras. Metade dos 16 proprietários alugam seus apartamentos de um dormitório no verão. Um problema que ocorria era o excesso de barulho, pois normalmente eram grupos de jovens que alugavam, e antes de saírem à noite para as festas, realizavam os famosos “esquentas” e na volta, alcoolizados, faziam bagunça. Com a modernização do regimento interno, o residencial Cenyra conta com um capítulo especial para locações de temporada. Nele consta que o proprietário da unidade a ser locada deverá informar ao síndico, por escrito, os dados do inquilino como nome, endereço, e telefone da imobiliária responsável pela locação, bem como da pessoa de contato. E dar preferência de locação para famílias.
O regimento exige a entrega do regimento interno ao locador, expressa as multas previstas para cobrança à vista, caso contrário recai sobre o proprietário. Também veda o inquilino a “permitir a entrada de pessoa estranha no condomínio sem o devido acompanhamento, a perturbação do sossego alheio com manifestações de embriaguez e atitudes não condizentes com os bons costumes”, aponta o documento. A síndica Heliane Conceição Pinto consegue impor a ordem, conhecendo a imobiliária e aplicando multa, “é comum o proprietário que loca não dar importância para o problema de alugar para pessoas que não respeitam as regras do condomínio. Afinal, não estão aqui. Só na hora que mexe no bolso que a pessoa corre para resolver a situação”, alerta.
Exigências no uso das áreas comuns
Outra dúvida frequente aos síndicos é sobre a possibilidade de proibir a utilização das áreas comuns. Segundo o presidente do Secovi, Fernando Wilrich, isso é considerado limitação de direito de propriedade e existem decisões judiciais neste sentido. Mas nada impede o condomínio de estabelecer regras, como a apresentação de exame médico para utilizar piscinas. Na questão da segurança, exigir que entrem com senhas, que não deixem portões abertos e todo o procedimento que seguem os moradores. “Regrando se evita transtornos”, salienta.
Um bom exemplo para se evitar comportamentos inadequados no prédio são os condomínios que proíbem no regimento o consumo de bebida alcoólica na piscina e área de lazer. Colabora para impedir que tanto inquilinos como proprietários circulem alcoolizados pelo edifício, principalmente no período de festas de fim de ano. Quando o assunto é visitas, segundo o diretor Julio Kipper, o condomínio pode inclusive, ao constatar em convenção e regimento, limitar a quantidade de visitantes nas áreas comuns, de lazer e quantidade de pessoas para pernoitar.
Roberta Kremer
Fonte: CondomínioSC