Com rotina flexível e atividades dinâmicas, profissão ganha espaço no mercado em que responsabilidades crescem cada vez mais.
Em 2008, a vida da advogada Erica Faerber passou por várias mudanças. Ao adotar Balneário Camboriú como sua nova cidade, ela leu uma matéria sobre o trabalho de síndicos profissionais e decidiu fazer um curso de especialização na área. Com experiência de seis anos como gestora do condomínio anterior em que morava, Erica decidiu se dedicar em tempo integral à nova profissão. E deu certo. Passados oito anos, ela comemora a escolha acertada. “Acordo todos os dias sabendo que poderão ocorrer situações que não estavam na rotina do dia. Isso me traz rapidez de raciocínio e uma vontade enorme de ver os resultados positivos”, relata.
Assim como Erica, muitas pessoas têm sido atraídas pela função de síndico profissional, que ganha espaço no mercado pelo aumento do número de condomínios e responsabilidades que envolvem o gestor. “Tenho observado em sala de aula e nos eventos que participo que o número de síndicos profissionais tem crescido. Há um aumento da complexidade das atividades e das responsabilidades, e o síndico morador não possui tempo adequado para dedicar-se e fazer uma boa gestão”, avalia Rosely Schwartz, coordenadora e professora do curso de Administração deCondomínios e Síndico Profissional da EPD (Escola Paulista de Direito), além de autora do livro Revolucionando o Condomínio.
Segundo a especialista, o perfil mais comum desse profissional envolve pessoas que assumiram o cargo de síndico no condomínio em que moravam. Com a experiência bem-sucedida e o gosto pelo trabalho, elas resolvem buscar especialização e colocação no mercado. Outra situação comum é a de administradoras que, ao perceberem o bom desempenho do síndico morador, fazem a indicação para outros edifícios de sua carteira de clientes. Além de Erica, esse gosto pela função de gestor no condomínio em que morava foi também o que atraiu Yamandu Martorell.
“Ser síndico de um condomínio é um aprendizado contínuo, nossos limites se expandem cada vez que somos impulsionados pela necessidade de melhora, pelos nossos erros. Compreender não somente a estrutura de um prédio, mas tentar compreender os moradores nas suas necessidades. Talvez seja esse o maior desafio”, avalia Yamandu, que depois de participar do conselho, assumir o cargo de subsíndico e de síndico de seu edifício, buscou profissionalização e hoje atua em seis condomínios.
Responsabilidade e transparência
Embora a profissão seja atrativa para pessoas com perfil dinâmico, Rosely destaca que é preciso consciência para todas as responsabilidades e dedicação exigidas pelo cargo. “Os riscos são muitos, não só para o profissional, mas também para o morador, caso ele não cumpra com as suas responsabilidades”, diz a especialista, ao listar pontos como o cumprimento da convenção, regulamento interno, normas tributárias, trabalhistas, segurança e limpeza, além das normas ABNT que estiverem relacionadas ao condomínio.
Caso haja prejuízos ou descumprimento de regras, o síndico profissional pode até mesmo responder à Justiça com seus bens pessoais. “No âmbito do condomínio, o síndico profissional pode responder administrativamente, com destituição e no âmbito civil e penal, conforme a legislação”, explica o advogado e consultor jurídico condominial Cristiano de Souza Oliveira, ao acrescentar que o gestor e o condomínio podem se garantir com seguros para eventuais problemas. Entre as responsabilidades passíveis de processos, que também valem para o síndico morador, estão a ação ou omissão voluntárias, negligência, imprudência, violação de direitos e danos a terceiros – inclusive morais.
Uma boa forma de evitar problemas, segundo Erica, é sempre trabalhar com a previsão orçamentária – exceto em casos de obras e benfeitorias, que também são decididas previamente. “Para o síndico não ter dificuldades no dia a dia, é muito importante fazer três orçamentos, para quando for interpelado, poder mostrar o motivo da contratação daquela empresa e a manutenção que está sendo feita”, detalha. “A responsabilidade é imensa, pois, por mais que dividamos com o conselho e os moradores nas assembleias, quem toma a decisão final é o síndico. Todo cuidado é pouco”, acrescenta Yamandu.
Erica ainda relembrou uma ocasião em que teve problemas em um dos condomínios em que atua. Ela contou que o edifício estava há anos sem realizar lavação e análise das pastilhas e fissuras da fachada, mas na assembleia os moradores não quiseram fazer a chamada de capital para as reformas necessárias. A síndica, então, fez um termo de responsabilidade, que os condôminos presentes assinaram e pelo qual se responsabilizaram caso houvesse algum sinistro. “Embora eu, como síndica, responda civil e criminalmente, se viesse a ter de responder um processo, teria provas de que sugeri as manutenções e que os condôminos se negaram a fazer a chamada de capital”, relata.
Síndica Erica Faerber: acordo todos os dias sabendo que poderão ocorrer situações que não estavam na rotina do dia. Isso me traz rapidez de raciocínio e uma vontade enorme de ver os resultados positivos.
Esse trabalho baseado na transparência é um quesito destacado pelos especialistas Rosely e Cristiano. “É sempre aconselhável que exista um conselho ativo, pois a decisão será coletiva e participativa. O apoio do conselho é essencial para os bons resultados, e assim como no caso do síndico morador, deve haver vasta exposição de números e atos”, orienta o advogado. “Recomendo a realização de reuniões frequentes e que as contas bancárias (corrente e de investimentos) sejam movimentadas em conjunto com o subsíndico ou algum dos conselheiros”, complementa Rosely.
A contratação
O primeiro passo para a contratação de um síndico profissional é a busca por boas referências, para não escolher “gato por lebre”, como frisa Cristiano. Para isso, o advogado indica também a avaliação do currículo do profissional e “se for a primeira contratação, fazer de forma a deixar claro uma decisão sempre compartilhada e um acompanhamento até haver segurança e confiança”. Depois, deverá ser convocada assembleia para eleição do gestor e uma ata é elaborada mencionando seus dados, “para que seja alterado, na Receita Federal, o CPF do responsável legal pelo condomínio”, explica Rosely.
A forma de contratação, por sua vez, é de representação, já que o Projeto de Lei para regulamentação da profissão está parado na Câmara dos Deputados. “Havendo contrato ou sendo a ata escrita com as cláusulas da representação, a duração é sempre a mesma do mandato que consta da convenção, não podendo ser superior a dois anos”, detalha Cristiano, ao especificar que o recebimento é por honorários, com emissão de nota por pessoa física ou jurídica. Não há direito a 13º salário ou férias remuneradas, a não ser que a última seja previamente estabelecida.
“Caso o síndico profissional não possua uma empresa, a legislação do INSS determina que seja recolhido 20% sobre o valor pago, como encargo do condomínio, e descontado 11% do profissional, respeitando o limite máximo do INSS, caso ele não comprove que já faz esse recolhimento”, diz Rosely. Os dois especialistas ainda explicam que não há expediente fixo a ser cumprido, tampouco piso salarial, sendo ambos negociados na formulação do contrato. “Cabe a cada mercado regional estabelecer associações para orientar sobre o salário, e não deixar que uma brilhante atividade caia no uso nocivo”, frisa o advogado.
Quem cedo madruga
As rotinas dos síndicos Yamandu e Erica são parecidas e começam cedo, já que os profissionais costumam visitar diariamente todos os condomínios em que atuam. “As visitas nos condomínios são diárias e de acordo com as necessidades de cada condomínio. Quando tenho situações importantes a serem resolvidas, dou uma atenção maior a esse condomínio. Mesmo assim, faço visitas constantes. Procuro ter uma equipe que faça as atividades com eficiência”, relata Erica, que montou seu escritório em casa e costuma trabalhar 10 horas por dia. “Dou prioridade aos assuntos mais relevantes e, no decorrer do dia, vou fazendo as outras atividades que são menos urgentes”, acrescenta.
Yamandu Martorell: a responsabilidade é imensa, pois, por mais que dividamos com o conselho e os moradores nas assembleias, quem toma a decisão final é o síndico. Todo cuidado é pouco.
Com expediente semelhante, Yamandu destaca ainda a importância da relação próxima com os zeladores. “Converso com os funcionários, principalmente com o zelador, que é uma figura importantíssima para o síndico. Observo as instalações, encontro com os moradores que transitam no edifício, atendo algum chamado de condômino. A toda hora tem alguma ligação ou mensagem para responder. A qualquer momento, se for necessária minha presença em algum dos condomínios, lá vou eu, bagunçando meu roteiro. Mas tudo bem, me reprogramo”, relata com bom humor.
Essa relação direta, segundo Erica, costuma variar, já que cada condomínio tem uma forma diferente de ser gerenciado. “Tem condomínios em que tenho mais autonomia, em outros é mais engessado”, conta ela, que costuma se dirigir ao conselho sobre os assuntos mais delicados, como troca de funcionários, advertências a condôminos e despesas extras. “A atuação do conselho junto ao síndico torna a administração mais tranquila e transparente”, comenta a síndica, que nesse quesito também tem postura parecida à de Yamandu, que define o conselho como “mensageiros das necessidades dos moradores”.
A relação com os condôminos, aliás, é outro ponto que recebe atenção especial dos dois síndicos. “Sempre que encontro um condômino, converso com ele, pergunto se está tudo bem, se está satisfeito com os serviços e digo para entrar em contato se precisar de algo”, conta Erica. “No início é mais difícil, por isso, nesse momento, tem que dedicar mais tempo para ‘sentir’ o condomínio, conversando com moradores e funcionários, lendo as atas anteriores, os livros de reclamações e sugestões. A maioria dos desejos e necessidades dos moradores é similar em todos os prédios, só que cada um com suas particularidades”, comenta Yamandu.
Apesar da rotina corrida e das inúmeras responsabilidades, os dois não deixam de expressar a satisfação com a profissão escolhida. Eles ainda destacam a importância de se trabalhar diretamente com o lar das pessoas, que costuma ser o maior patrimônio e o lugar-seguro das famílias.
“Ser síndico é um desafio diário, e todos os dias temos que encarar com muita energia, dos pequenos detalhes às grandes obras, assim como as decisões difíceis, que afetam a vida de todos os moradores. Não vamos agradar a todos, mas sempre tentamos fazer o certo”, finaliza Yamandu.
Fonte: CondomínioSC